Glossário
Sem prejuízo do necessário aprofundamento teórico-concetual, afigura-se essencial uma harmonização de terminologia para todos/as os/as profissionais que trabalham no âmbito da violência doméstica e violência de género, considerando-se, para o efeito, os previstos nos documentos orientadores nesta área.
AVALIAÇÃO E GESTÃO DE RISCO: metodologia de recolha de informação que permite aferir o grau de perigosidade da situação vivenciada, auxiliar a definição do plano individual de intervenção e da pertinência de integração na estrutura ou resposta que melhor garanta a proteção e segurança da vítima, apoiando-a nas suas decisões. O fim último deste processo é a proteção e segurança das vítimas de violência doméstica, numa perspetiva de respeito pelos seus Direitos Humanos. O processo de avaliação e gestão de risco é essencialmente um processo de gestão de informação e tem natureza dinâmica e contínua. Em relação aos instrumentos de avaliação, existe uma multiplicidade de exemplos, sendo que os sistemas de justiça, as forças de segurança e algumas estruturas de atendimento recorrem a instrumentos empíricos e/ou cientificamente validados.
EMPODERAMENTO: processo através do qual as pessoas, as organizações e as comunidades adquirem o controlo sobre as suas vidas, implicando o desenvolvimento da sua consciência crítica, a promoção da participação nos processos de tomada de decisão e o acesso a recursos, incluindo a informação, no respeito integral pelos seus direitos.
ESTEREÓTIPOS DE GÉNERO: são representações generalizadas e socialmente valorizadas acerca do que devem ser os homens e as mulheres (traços de género) e fazer (papéis de género). Papéis e traços ligados e normalmente hierarquizados, ou seja, os ditos traços “femininos” – a mulher é mais carinhosa e frágil – são menos valorizados socialmente que os “masculinos” – o homem é forte e racional.
ESTRUTURAS DE APOIO À VÍTIMA: as organizações da sociedade civil, não-governamentais (organizações não governamentais, organizações não governamentais de mulheres, instituições particulares de solidariedade social, fundações ou outras associações sem fins lucrativos), legalmente estabelecidas, cuja atividade se processa em cooperação com a ação do Estado e demais organismos públicos.
GÉNERO: refere-se aos papéis, aos comportamentos, às atividades e aos atributos socialmente construídos que uma determinada sociedade considera serem adequados para mulheres e homens.
Fonte: Artigo 3 – “Definições”, alínea c) da Convenção de Istambul
INTERSECIONALIDADE: é um instrumento analítico que permite interpretar e intervir sobre a interação e as interseções de cada uma das pessoas (e.g.: sexo, orientação sexual, origem étnica, origem racial, classe social, diversidade funcional, entre outras), e como essas interseções estruturam experiências específicas de opressão, privilégio, dominação e discriminação. Permite abordar a forma como os diversos sistemas de discriminação e opressão criam desigualdades e estruturam as relações e interações sociais, tendo em consideração os contextos históricos, sociais, culturais, económicos e políticos. Paralelamente, permite interpretar o impacto da interseção das múltiplas identidades no acesso aos direitos e oportunidades.
INTERVENÇÃO EM CRISE: conjunto de ações de intervenção imediata, focalizado em acontecimentos e situações precipitantes relacionadas com a violência, sobretudo perante uma situação de alto risco.
PESSOA AGRESSOR/A: alegado/a autor/a de crime de violência doméstica ou de género, mesmo que ainda não tenha sido formalizada denúncia do mesmo.
PLANO DE SEGURANÇA: é um dos produtos resultantes da gestão de risco. O plano de segurança permite à vítima identificar as suas necessidades e recursos de forma a preparar-se para as situações de emergência e risco. Os planos de segurança devem adequar-se às diferentes fases em que a vítima se encontra na relação abusiva, de forma a preparar estratégias de segurança quando ainda se mantém essa relação, quando se prepara para sair da relação e mesmo na situação de pós saída, e devem ser flexíveis para se adequar às transformações no processo de rutura de uma relação abusiva. A elaboração do plano de segurança beneficia do apoio técnico especializado e de suporte na sua adequação ao risco estimado.
REDE NACIONAL DE APOIO ÀS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA: o conjunto dos organismos vocacionados para o apoio às vítimas, incluindo o organismo da Administração Pública responsável pela área da cidadania e da igualdade de género, o Instituto da Segurança Social, I. P. (ISS, I. P.), as casas de abrigo, as estruturas de atendimento, as respostas de acolhimento de emergência, as respostas específicas de organismos da Administração Pública, os grupos de ajuda mútua e o serviço telefónico permanente, gratuito e com cobertura nacional, de informação a vítimas de violência doméstica.
TÉCNICO/A DE APOIO À VÍTIMA (TAV): a pessoa devidamente habilitada que, no âmbito das suas funções, presta assistência direta às vítimas. Os requisitos e qualificações necessários à habilitação dos/as TAV encontram-se definidos no Despacho n.º 6810-A/2010, de 15 de abril, publicado no Diário da República n.º 74/2010, 1.º Suplemento, Série II, de 2010-04-16.
VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES: constitui uma violação dos direitos humanos e é uma forma de discriminação contra as mulheres, abrangendo todos os atos de violência de género que resultem, ou possam resultar, em danos ou sofrimentos físicos, sexuais, psicológicos ou económicos para as mulheres, incluindo a ameaça de tais atos, a coação ou a privação arbitrária da liberdade, tanto na vida pública como na vida privada.
Fonte: Artigo 3 – “Definições”, alínea a) da Convenção de Istambul.
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA: “1 – Quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais:
a) Ao cônjuge ou ex-cônjuge;
b) A pessoa de outro ou do mesmo sexo com quem o agente mantenha ou tenha mantido uma relação de namoro ou uma relação análoga à dos cônjuges, ainda que sem coabitação;
c) O progenitor de descendente comum em 1º grau; ou
d) A pessoa particularmente indefesa, nomeadamente em razão da idade, deficiência, doença, gravidez ou dependência económica, que com ele coabite; é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
2 – No caso previsto no número anterior, se o agente praticar o facto contra menor, na presença de menor, no domicílio comum ou no domicílio da vítima é punido com pena de prisão de dois a cinco anos.
3 – Se dos factos previstos no nº 1 resultar:
a) Ofensa à integridade física grave, o agente é punido com pena de prisão de dois a oito anos;
b) A morte, o agente é punido com pena de prisão de três a dez anos.
4 – Nos casos previstos nos números anteriores, podem ser aplicadas ao arguido as penas acessórias de proibição de contacto com a vítima e de proibição de uso e porte de armas, pelo período de seis meses a cinco anos, e de obrigação de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica.
5 – A pena acessória de proibição de contacto com a vítima deve incluir o afastamento da residência ou do local de trabalho desta e o seu cumprimento deve ser fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância.
6 – Quem for condenado por crime previsto neste artigo pode, atenta a concreta gravidade do facto e a sua conexão com a função exercida pelo agente, ser inibido do exercício do poder paternal, da tutela ou da curatela por um período de um a dez anos.”
Fonte: Artigo 152.º do Código Penal – Enquadramento jurídico de Violência Doméstica.
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA CRIANÇA OU JOVEM: todas as formas, reiteradas ou não, de mau trato físico e ou psíquico (emocional), incluindo tratamento negligente, exploração, castigos corporais, privações de liberdade e ofensas sexuais, praticadas contra criança ou jovem, ou na sua presença ou por si vivenciadas, que coabitem com a pessoa agressora, de que resultem danos para a saúde, sobrevivência, desenvolvimento ou dignidade da mesma. A difusão por internet ou outros meios de divulgação pública generalizada de dados pessoais, designadamente imagem ou som, relativos à intimidade da vida privada da vítima sem o seu consentimento, também se inclui na violência doméstica contra criança ou jovem.
VIOLÊNCIA DE GÉNERO: a violência dirigida contra uma pessoa devido ao seu género, à sua identidade de género ou à sua expressão de género, ou que afete de forma desproporcionada pessoas de um género particular, é considerada violência baseada no género. Pode traduzir-se em danos físicos, sexuais, emocionais ou psicológicos, ou em prejuízos económicos para a vítima. A violência baseada no género é considerada uma forma de discriminação e uma violação das liberdades fundamentais da vítima, e inclui a violência nas relações de intimidade, a violência sexual (nomeadamente violação, agressão e assédio sexual), o tráfico de seres humanos, a escravatura e diferentes formas de práticas perniciosas, tais como os casamentos forçados, a mutilação genital feminina e os chamados «crimes de honra». As mulheres vítimas de violência baseada no género e os seus filhos necessitam muitas vezes de apoio e proteção especializados, devido ao elevado risco de vitimização secundária e repetida, de intimidação e de retaliação ligado a esse tipo de violência.
Fonte: Definição de violência de género da DIRETIVA 2012/29/UE DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO de 25 de outubro de 2012 que estabelece normas mínimas relativas aos direitos, ao apoio e à proteção das vítimas da criminalidade e que substitui a Decisão-Quadro 2001/220/JAI do Conselho
VIOLÊNCIA DE GÉNERO EXERCIDA CONTRA AS MULHERES: abrange toda a violência dirigida contra a mulher por ser mulher ou que afeta desproporcionalmente as mulheres.
Fonte: Artigo 3 – “Definições”, alínea d) da Convenção de Istambul.
VÍTIMA: a pessoa singular que foi objeto de uma ação ou omissão da qual tenha resultado, ou seja passível de resultar, um dano ou sofrimento de natureza física, sexual, psicológica ou económica num contexto de violência doméstica, incluindo a ameaça do cometimento de tais atos.
Fonte: Definição assente no previsto na Lei n.º 130/2015 de 4 de setembro, que procede à vigésima terceira alteração ao Código de Processo Penal e aprova o Estatuto da Vítima, transpondo a Diretiva n.º 2012/29/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2012, que estabelece normas relativas a os direitos, ao apoio e à proteção das vítimas da criminalidade, e na Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro, que estabelece o regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica, à proteção e à assistência das suas vítimas, alterada e republicada pela Lei n.º 129/2015 de 3 de setembro.
VÍTIMA EM SITUAÇÃO DE ESPECIAL VULNERABILIDADE: vítima cuja especial fragilidade resulte, nomeadamente, devido à idade (diminuta ou avançada idade), estado de saúde, deficiência ou incapacidade, gravidez, dependência económica, etnia, condição social, identidade de género, expressão de género e orientação sexual, bem como do facto, tipo, grau e duração da vitimização haver resultado em lesões com consequências graves no seu equilíbrio psicológico ou nas condições da sua integração social.
Fonte: Definição assente na legislação mencionada na nota anterior