25 de abril - o que mudou
25 de abril - o que mudou
Engénia, Nuno & Paulo
EUGÉNIA, NUNO E PAULO

O que é que o 25 de Abril mudou na tua vida?

Na minha vida propriamente dita não mudou nada. A vida que tinha continuei a ter, ter de limpar a casa, lavar roupa, ter de tratar dos filhos e educar os filhos, ter o comer na mesa a horas para o teu pai. Não mudou nem para mim nem para as mulheres que trabalhavam em casa, ninguém se lembrava de nós e ninguém se lembra ainda hoje. Mas para as pessoas em geral mudou a liberdade. Não havia. Não podíamos estar num grupo de pessoas na rua, não se podia falar alto certas coisas, andava sempre os disfarçados da PIDE à espreita. Tinha de se medir as palavras. Havia medo. As pessoas perderam o medo.

O que mudou na minha vida?

Olha no tempo do Salazar não podias ser aquilo que és. Hoje podem tratar-te com preconceito e até chamar-te nomes, porque ainda é difícil, mas naquela altura o mais certo era fazerem-te a vida negra por seres assim. Ainda ias preso e faziam-te mal.

Olha, também isso de dizeres às pessoas tudo o que pensas estejas onde estiveres e de não te importares se é chefe ou não, se é rico ou pobre. Estavas tramado, arranjavas um 31. Não sei se se pode dizer isto, mas levas a liberdade de pensamento e de expressão muito a sério. O teu pai dizia “tenho muito medo por este miúdo, não se cala a ninguém”. Não podias ser assim na ditadura. Ias preso.

ESPERANÇA CHARNEÇA
ESPERANÇA E NATIVIDADE

O que é que o 25 de Abril mudou na tua vida?

Nasci no Alentejo, Freguesia de Boa-Fé, Concelho de Évora.

Filha mais nova de uma prole de 8 irmãos, conheci a dureza da vida do campo – isolamento, percursos de 3h para ir e vir da escola, a pé… Na altura achava que a vida era assim, uns nasciam ricos, outros pobres e, com muito trabalho, poder-se-ia aspirar a ser remediado. Os irmãos mais velhos, os homens, cuidariam de mim e da minha irmã, por sermos raparigas… E assim foi… seriam eles a libertar-nos daquele lugar que amávamos, mas, que muito cedo percebemos teríamos de abandonar porque, por mais que trabalhássemos, nunca sairíamos da “cepa torta”.

Não fui servir, profissão muito em voga na época, fui trabalhar para Lisboa para o estabelecimento de um irmão mais velho, fiquei na Visconde Valbom e já era uma rainha, embora pobre. Depois casei e tive um filho e uma filha e fui viver para Setúbal. Terra de gente que pensava que a vida não podia ser tão madrasta para alguns…. Convivi com alguns membros do Partido Comunista, da oposição e da conspiração, mas tinha dois filhos e não fui muito atrevida, mas percebi que havia muito mais mundo e, timidamente, até ajudei os mais corajosos, fiquei de esquerda, como ainda se diz.

Tudo mudou naquela manhã, respirava-se a esperança da Liberdade. O primeiro 1º de maio, foi, de facto, o mais emocionante. Todos unidos, sem divisões. Lembro-me de ouvir os passos marcados de quem vinha de Palmela, das lágrimas, da emoção. Tudo na rua a celebrar.

Os salários melhoraram, o medo da guerra colonial que angustiava as mães desapareceu, a vida podia ser outra coisa e muito melhor. Sempre fui muito independente e pouco submissa, mas as outras mulheres também me importavam e saber que todas podíamos ser independentes era uma grande alegria.

O resto da história todos conhecemos, demorou tempo, mas por muito que refilemos Portugal mudou muito e muito depressa…

Vale a pena celebrar sempre o 25 de Abril e não esquecer.

O que mudou na minha vida?

Para ti filha, moldou a tua vida…

Pudeste estudar e ir para a Universidade, pudeste participar em Associações de Estudantes, em Juventudes partidárias, pudeste crescer a falar, a ouvir, a gritar nas ruas por aquilo que acreditavas, mesmo que nem sempre fosse o mais correto, mas eram os tempos…

És uma mulher forte e com força e isso deu-te abril, és uma mulher determinada e com sucesso e isso deste a ti própria com muito trabalho…

Sim, porque sempre adoraste trabalhar mesmo com prejuízo para a família e não sei quando vais parar ou se queres parar…

Por muito que te aconselhe farás sempre o que queres e isso são os meus genes, fui eu que te dei.

VIVA O 25 DE ABRIL E TODAS AS MÃES E FILHAS CORAGEM!

LÚCILA E MARTA
LÚCILA E MARTA

O que é que o 25 de Abril mudou na tua vida?

O 25 de Abril mudou tudo na minha vida. Até aos 18 anos cresci e vivi numa pequena cidade do interior, onde as coisas corriam, sem que eu me apercebesse bem do que estava errado. Por exemplo, sempre andei em escolas em que os meninos estavam separados das meninas, quer nas aulas, quer nos recreios. Já na escola secundária, o diretor falava constantemente ao altifalante que os/as alunas/os só se podiam encontrar a mais de 100 metros da escola, as meninas deveriam usar as batas 10 cms abaixo do joelho (claro que algumas, em gesto de protesto, descosiam as bainhas e andavam assim com elas soltas). Os rapazes sempre tiveram educação física, para quando chegassem à idade da tropa estarem bem preparados para irem para a guerra colonial. As meninas nas aulas extracurriculares eram preparadas para serem boas donas de casa, ou seja, tinham culinária, enfeitavam jarras, ensinavam como se devia passar a ferro, e em relação a educação física, embora existisse nos horários, passava todo o ano e nunca aparecia professor ou professora. Tive ainda um professor de Contabilidade, que nos pedidos para assinarem os nossos livros de autógrafos escreveu “ Deus, Pátria e Família, eis a trindade a que deves condicionar a tua vida”. Mais tarde vim a perceber que tinha ligações à polícia política.

Aos 18 anos vim para Lisboa trabalhar para a Central Telegráfica, pertencente aos CTT, onde comecei a ter conhecimentos com pessoas que me despertaram para a política. Comecei a ler poemas de livros que me emprestavam e um amigo ofereceu-me no aniversário, um do ZECA, que ainda guardo. Em 1973, já participei nos comícios do MDP/CDE, que se opunha dentro do possível, ao poder instituído. Lembro-me perfeitamente dum comício na Amadora, em que tivemos que fugir à frente dos cavalos da polícia.

25 de Abril uma festa e o acreditar que tudo iria mudar. Não fui para a rua, porque a minha filha tinha 20 dias, mas fui ao 1º de Maio deixando-a ao cuidado de minha mãe. O 25 de Abril só por si, não operou todas as mudanças que queríamos, mas permitiu, que através da luta, tudo mudasse. Nesta altura já a trabalhar na CGD, onde por sermos banco público, não tínhamos direito à sindicalização, quando todos os outros bancários já tinham esse direito, conseguimos o direito à sindicalização. As mulheres com as mesmas habilitações, que os homens, entravam sempre como datilógrafas, eles para a carreira de escrita. Elas só ao fim de alguns anos como datilógrafas podiam concorrer aos mesmos cargos que os homens tinham logo de entrada. Com o 25 de Abril, isto foi uma das mudanças na Empresa, quase de imediato. Eu, pessoalmente, consegui ser membro de Direção de uma coletividade, delegada sindical, membro da Comissão de Trabalhadores da CGD e depois sócia fundadora do Sindicato do Grupo Caixa, tendo de imediato pertencido à sua Direção.

Quando a minha filha nasceu, as mães apenas tinham direito a 30 dias, por maternidade, o que aconteceu comigo, pois ainda não tinha passado tempo suficiente para mudar a lei, no entanto em pouco tempo, esta foi melhorando, bem como os salários.

ASCENSÃO E SANDRA
ASCENSÃO E SANDRA

O que é que o 25 de Abril mudou na tua vida?

Deu-me mais autonomia. Antes as mulheres eram mais submissas. Tinham que ser, não é? Dependiam obrigatoriamente dos maridos para tudo. Eram obrigadas a depender. Mas a partir daí puderam ter liberdade para fazer tudo o que quisessem. Era uma época difícil. A PIDE andava sempre de olho, e nós sempre com medo que nos estivessem a vigiar.

O que mudou na minha vida?

Na tua vida mudou tudo!! Aumentou as tuas possibilidades de desenvolvimento a nível social, a nível escolar…mudou tudo Sandra! Ia ter sido muito difícil teres feito o caminho que fizeste antes do 25 de abril…ui era impossível! Não podias ter estudado até onde estudaste vindo de uma família modesta, nunca poderias ter viajado como fizeste… bom e politicamente ias ter muitos, mas muitos problemas. Feministas e Estado novo não era uma combinação admissível.

MANUELA E ANTÓNIO
MANUELA E ANTÓNIO

O que é que o 25 de Abril mudou na tua vida?

A maior conquista foi a liberdade, principalmente a liberdade de se poder falar sem medo de que alguém estivesse à escuta para informar a PIDE.

O que mudou na minha vida?

Para as gerações futuras a maior conquista foi a possibilidade de toda a gente ter oportunidade para estudar e também fiquei feliz por não teres de ir para a guerra.

GRAÇA E RITA
GRAÇA E RITA

O que é que o 25 de Abril mudou na tua vida?

O dia 25 de Abril de 1974, para mim foi algo de misterioso, pois já estava a trabalhar na função pública e habituada a não poder revelar quanto eu ansiava pela conquista do espaço social e político da condição de ser mulher. Foi misterioso porque esse dia trouxe-me algum medo (os maus andam à solta) e ao mesmo tempo uma alegria sem par. Será que vamos mesmo ser livres?

As notícias e os dias seguintes confirmaram a minha alegria. Estava livre para a minha luta pelo serviço nacional de saúde, pela desigualdade salarial entre homens e mulheres e muito mais. Eis que surge no meu caminho Maria de Lourdes Pintassilgo.

Com ela, aprendi tanto e dei tanto de mim aos outros que não mais me faltou a coragem no meu poder de decisão. Antes do 25 de Abril já era mãe de um rapaz de dois anitos, e a vivência da altura era a que descrevi.

O que mudou na minha vida?

Na tua vida filha já muita coisa tinha mudado pois nasceste em 1977, e aí sim todos os meus valores já estavam consolidados e, ainda na minha barriga, já me acompanhavas a ensinar mulheres bem adultas a ler e a escrever e a sair da opressão. Tudo isto gratuitamente e em horário pós-laboral. A mudança já nasceu contigo, e ao longo destes anos orgulho-me do bom trabalho que fiz, pois, a minha filha, a minha mulher, é o prolongamento deste trabalho na vivência do seu dia a dia.

TERESA MARTA E RITA
TERESA, MARTA E RITA

O que é que o 25 de Abril mudou na tua vida?

O 25 de Abril foi uma enorme alegria, uma lufada de Esperança num país com Liberdade e com menos desigualdades. No concreto, a minha vida não teve grandes mudanças: no meu trabalho e na vida de família houve uma grande continuidade, mas acompanhei pessoas que sofreram grandes alterações do seu dia-a-dia, algumas bastante difíceis pelas inevitáveis turbulências das revoluções (mesmo das mais pacíficas)

O que mudou na minha vida?

Na tua vida, mudou a perspectiva de viver num país finalmente a abrir se ao mundo, com horizontes mais largos na partilha das experiências de vida, na cultura, na educação, no pensamento. No imediato o ensino sofreu o entusiasmo de sucessivas remodelações que me obrigaram a uma maior atenção, pois acontecia alguma desorientação na aplicação dos currículos. Reconheço que o alargamento do acesso à educação foi uma conquista importantíssima que beneficiou muitas famílias, embora no teu caso não alterasse as expectativas familiares. Lembro-me da tua alegria a cantares cantigas de protesto, mas já antes do 25 de Abril te tínhamos ensinado muitas dessas cantigas que contávamos em conjunto…

Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género - CIG